Ao tomar contacto com o Orçamento da Câmara de Arouca para o corrente ano (ainda não aprovado), de imediato me ocorre um conjunto de circunstâncias referenciadas em dois artigos que publiquei neste jornal. Um em Agosto de 2009 cujo título era «As opções da Câmara e os condicionalismos futuros» e precisamente o último publicado em Fevereiro; «A gaveta».
Ainda que de forma sintética vale a pena recordar o que na sua essência escrevi. No primeiro referia que por opção política ou por necessidade induzida (por parte do governo central) a Câmara Municipal de Arouca avançou para a reestruturação/construção dos centros escolares e os novos equipamentos sociais (no âmbito do Programa PARES).
Considerada como «obra estruturante» para o município a reestruturação do Parque Escolar assumiu um carácter de extrema premência. Escrevia então que a «Câmara de Arouca, ao tomar esta preferência, assumida sobretudo pelo actual Presidente da Câmara como «um desígnio municipal», e se pretender continuar a corresponder ao que está pensado na Carta Educativa, estará grandemente condicionada a acção futura dos Executivos para as diferentes áreas de acção política. Inclusive a capacidade de endividamento e consequentemente a sua estabilidade financeira».
As Grandes Opções do Plano (GOPs) para o ano 2010 confirmam tais pressupostos. Só os gastos com a educação vão absorver em 2010 cerca de 55% do orçamento.
Já na altura dava a título de exemplo que dois dos primeiros centros escolares a avançar (Fermêdo e Escariz) representam um investimento superior a quatro milhões de euros. As GOPs assinalam 4.531.497€. O pólo do Burgo custará 2.792.357€, de Rossas 2.055.00€ e Canelas 705.000€. O documento avança ainda valores para Arouca (705.000€) e Alvarenga (705.000€).
De recordar que só cinquenta por cento dos custos são suportados por verbas do QREN (Quadro de Referência Estratégica Nacional). O restante será assumido pela autarquia. De referir também que a Câmara e a Assembleia Municipal já aprovaram um empréstimo de três milhões de euros. Valor este que vai cobrir parcialmente os custos imputados à Câmara dos primeiros centros escolares (Burgo Escariz, Fermedo, Chave, Rossas e Canelas). A projecção que pode ser feita a partir da carta educativa aponta para o dobro dos equipamentos.
Independentemente da necessidade que existe em Arouca ter espaços escolares de qualidade parece certo que não existirá capacidade financeira para concretizar os Centros Escolares previstos na Carta Educativa do município (na altura da sua aprovação apresentada e propagandeada como paradigma de uma boa carta educativa), pelo que fará todo o sentido que esta seja revista de imediato. Haja coragem política para tal!
Mas a juntar a este desafio há um outro. A Câmara comprometeu-se a subsidiar no decorrer do anterior ano (que não cumpriu), neste e nos próximos, as instituições de solidariedade social. Refira-se os valores já aprovados atingem perto de dois milhões de euros.
Escrevia eu na altura que o valor global para estes duas vertentes impressiona, tendo em conta o reduzido orçamento anual da Câmara. Isto quando se sabe que pela primeira vez as despesas correntes ultrapassam as despesas de capital. O que é grave!
Perante este cenário há um conjunto muito vasto de condicionantes para os próximos Executivos. Se juntarmos às duas áreas referidas a urgência de investimentos no saneamento básico e a dívida da Câmara 4.788.946,07€ fica-se com uma sensação de um aperto financeiro nunca visto em terras de Santa Mafalda.
Neste quadro e depois de uma ano de 2009 com uma acção política claramente a pensar nas eleições (que acabaram por trazer bons frutos para o partido socialista) a Câmara de Arouca vê-se este ano e pela primeira vez claramente condicionada, não conseguindo corresponder minimamente às expectativas – sobretudo as que estavam cridas junto dos autarcas de freguesia.
Recordo que tal como escrevi no apontamento «A gaveta» a Câmara no início deste ano fez chegar a cada Presidente da Junta de Freguesia um ofício solicitando que perante «as principais linhas programáticas do Executivo Municipal para o quadriénio que agora se inicia (i. educação; ii acção social; iii ambiente iii turismo), solicito que as sugestões sejam apresentadas por ordem de prioridades, até ao máximo de seis acções, e se possível até ao fim do presente mês de Janeiro».
É agora verificável que esta solicitação mais não era que um engodo, um «verdadeiro tapa olhos» como já referem vários presidentes de junta, quando confrontados com um plano que não corresponde minimamente, recheado de «verbas simbólicas» dissimuladas em rubricas para todos os gostos e feitios e grandemente inflacionado.
Não foi nem será assim possível corresponder aos «estratégicos» compromissos assumidos. E assim acontece mais uma vez que as propostas dos autarcas de freguesia ou ficam na gaveta ou se arrastarão no tempo.
Tal como já escrevi este enredo político não é justo nem sensato. Não faz sentido, de modo algum, criar expectativas, em primeira instância junto dos autarcas de freguesia e depois nas populações locais, que não minimamente são correspondidas.
Independentemente de uma análise mais circunstanciada o que nos espera para 2010 é um plano limitado, sem desígnio e sem a sustentabilidade que se exigia tendo sobretudo em conta as reais necessidades do concelho.
Publicado na edição de Abril do jornal Roda Viva